Quantos anos você tem mesmo?

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Meu aniversário este ano foi diferente. Diferente dos outros, que chegam leves e felizes, esse veio com peso de data de validade. 36 não é 35. Nem que seja por um dia, agora você já passou da linha da idade certa. As noites que antecederam o “meu dia” foram preenchidas por leituras sobre congelamento de óvulos, adoção, e porcentagens sobre o risco de uma gravidez tardia. Independente da fonte, todas as matérias concordam que seria benéfico ter começado antes. 32 era melhor que 35. A pesquisa me fez pensar sobre a importância da data de nascimento.

Não tenho nenhuma dúvida de que o tempo é soberano. As rugas aparecem, os joelhos cansam, minha disposição para ficar acordada a noite toda, por exemplo, foi embora assim que eu terminei a faculdade. Hoje em dia, ressaca às vezes tem sintomas de doença grave e eu sinto falta da época em que drinks extras eram simplesmente motivo para rir no café da manhã. Outras coisas, por outro lado, não mudaram muito. Tenho preguiça de dobrar roupas exatamente como quando adolescente. Gosto de salgadinhos como criança. Só não digo que a minha disposição esportiva é de uma pessoa idosa para não ofender pessoas idosas. Em comédias românticas, eu tenho 16. Em filmes de terror, me assusto como se tivesse 6 e continuo fechando os olhos nas cenas de crime. 

O que eu vejo, na prática, é que enquanto a gente varia de idade durante o dia, às vezes conforme o humor, a presença ou não de sol ou de companhia agradável, o ano da carteira de identidade continua exercendo sobre nós um poder constante. Essa pressão vai muito além dos “16 para votar” e  dos “18 para dirigir”. Casar antes dos 32, ter o primeiro filho antes dos 35, o segundo antes dos 38. Comprar um apartamento antes dos 40. Construir uma carreira antes dos 42. Em 2019, a minha sensação é que ainda estamos pautados por essa corrida de obstáculos como se a vida fosse terminar aos 60.

Às vezes, a vida termina amanhã. A gincana, mais do que produtiva, me parece apenas estressante. Em vez de levantar a bandeira da idade, como muita gente faz, ou escondê-la, eu queria que fosse possível, simplesmente, não focar tanto nisso. Que todo o mundo tenha o direito de recomeçar quantas vezes forem necessárias, que estabilidade não se torne uma obrigação, que a gente consiga admirar o outro pela persistência, inteligência, flexibilidade, sem usar o parâmetro silencioso do “nova” ou “velha” demais. 

O espelho sabe quantos anos eu tenho. Essa sensação de fracasso ao passar por todos esses prazos sem conseguir vencê-los não ajuda a manter um olhar positivo sobre nós mesmos. A gente perde um pouco do brilho e do amor próprio toda vez que se ajusta para caber nessas expectativas apertadas que a gente nem sabe quando criou. 

Antes de culpar as pressões alheias, talvez seja uma boa hora para reconhecer as nossas. Talvez precisaremos de um botox para nos manter otimistas e entender que o mundo mudou mesmo. Nós temos mais liberdade, mais escolhas. Em boa parte dos casos, a nossa linha do tempo vai ser diferente da dos nossos pais. Nem todos os casamentos duram para sempre, salários promissores não são a regra. Afirmo, por experiência própria, que ficar para tia está longe de ser uma derrota.

Independente da data, o meu desejo para mim e todos vocês é que a gente continue corajoso. Depois de pensar sobre os aniversários, concluí que o oposto da juventude não é a velhice. 

O oposto da juventude é o medo.