Tenho tido algumas dúvidas incômodas ultimamente. Será que algum namorado agressivo repensou sua conduta com nossos posts sobre estupro? Será quem protestou pelo impeachment entendeu a gravidade da palavra pacto? É importante que todo mundo tenha a sua voz. É importante dar volume a assuntos que merecem a nossa atenção, mas fico na dúvida se não estamos todos falando para quem já concorda, se estamos mesmo debatendo alguma coisa ou só gritando sem escutar.
Não sei avaliar o quanto a nossa energia está sendo bem usada. Apesar de tanto contato, eu vejo desconexões. Criamos um tempo paralelo, de novidades sem pausa, e alcançamos a capacidade de concentração de um peixe. Diluímos a informação em notícia, manchete, tweet e sabemos nada sobre muita coisa. Desbloqueamos o celular 150 vezes por dia e falamos o tempo todo sobre nós mesmos.
Imaginei um Facebook físico e a cena me deixou desconfortável. Num corredor Xing Ling, estamos cada um na própria barraquinha, com nossas fotos penduradas, opiniões na moldura, chamando todo mundo para dar uma olhada. O preço é sempre o tempo. Há tendas que juntam mais gente, assuntos que viram tema, mas, como todo comércio, a gente só compra o que quer.
Nem sempre. Tem dias que eu volto cheia de pacotinhos de dor. Com raiva de opiniões absurdas, com vontade de ter o que eu não tenho, com muitos julgamentos apressados que me fazem gostar menos de alguns amigos. Como é tudo muito rápido e as coisas boas se misturam, normalmente eu não percebo quando incluo um peso que ainda não sei absorver.
Sinto que preciso ficar mais atenta: separar melhor o que é desejo do que é frustração, o que é expectativa do que me gera ansiedade, entender se mostrando meu ponto de vista ou só cultivando a minha intolerância. O risco do conteúdo customizado é esse rompimento. Se perdermos a capacidade de ouvir, perderemos a capacidade de nos comunicar.
Ficaremos muito sozinhos.